terça-feira, janeiro 27, 2015

Dar cenouras aos profissionais de saúde (no sector privado)...

.
"Do lado dos profissionais de saúde, considera que o comportamento também é diferente quando estão nas unidades privadas, “pois são vistos como parceiros e o efeito da cenoura ainda é importante e estimulante" (Artur Osório, Presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada) link 

Algumas instituições privadas de Saúde perspectivam os profissionais de Saúde como burros que perseguem a cenoura (sem nunca a atingirem!). Para eles, todo o quadro teórico de gestão, motivação, progressão profissional, auto-realização, etc, é algo relegável para um plano secundário - a história do burro e da cenoura é mais fácil, simples e compensatória!

sexta-feira, janeiro 23, 2015

No Facebook, a discussão continua (com o Bastonário dos Médicos)...

(o tamanho da resposta do Bastonário da Ordem dos Médicos é tão grande, que não é publicável como imagem)
.
Caro Dr. José Manuel Silva (doravante, Dr. JMS),

É com gosto, mas sem grande prazer, que lhe respondo a mais um conjunto de argumentos, dentro daquilo que V. Exa considerou um… “debate”. O meu objectivo, possivelmente, não é semelhante ao meu.
Está patente - permita-me a minha observação - uma mudança do seu estilo literário entre a sua primeira intervenção e esta última. Subitamente tornou-se num homem encolerizado. Um "debate" promove assim tanta cólera?
Felizmente, uma fatia muitíssimo substancial de Médicos não comunga dos seus princípios, Dr. JMS!
Desta vez organizo a minha resposta por “capítulos” (associando sempre uma citação sua), chamemos-lhe assim.
Como o senhor se baralhou todo nos seus argumentos, facilitou-me imenso a tarefa, como poderá constatar mais abaixo. O Dr. JMS contradiz-se com muita frequência, sabia!?
Uma nova nota próloga: O senhor prometeu-me desenhos e não os trouxe; mas eu trouxe.
Em resposta aos temas que abordou:

Capítulo “Burkas”.

(…) Num país democrático e sem constrangimentos religiosos, não dialogo com um “homem de burka”(…)

Se vive num país sem constrangimentos religiosos, porquê tanto prurido com uma religião (ao ponto de se recusar a dialogar com alguém). Eu não partilho da mesma posição. Respeito a pluralidade religiosa. Na verdade, desde que discreteie com argumentos alicerçados na ciência e na evidência, pouco me diz respeito a religião que professa. No conhecimento somos todos iguais, independentemente de raças, etnias ou religiões.

Uma burka é pedaço de tecido (usualmente negro) que cobre todo o corpo, deixando apenas os olhos destapados. Não me incomoda. É-me indiferente. Contudo, já revelo uma certa preocupação quando vejo alguém usar o corpo destapado e a burka à frente dos olhos.


Capítulo “Respeito pelos Enfermeiros”.

(…) Respeito profundamente os enfermeiros e a sua profissão (…)
Discordamos já aqui. Não, não respeita! No decorrer da sua exposição “apaixonada” (eufemisticamente falando) usou uma velha técnica: um pequeno elogio, uma grande ofensa; um pequeno elogio, uma grande ofensa; e assim sucessivamente intercalados.
Em parte, o Dr. JMS tem responsabilidades na crescente disfuncionalidade entre Enfermeiros e Médicos.
Poe exemplo, no Correio da Manhã (CM) do dia 15 de Agosto de 2013, a ladear a sua coluna regular, vislumbra-se uma peça jornalística, intitulada assim: “Triagem mal feita provoca mortes”!
A peça (que é pouco mais do que vazia de conteúdo) omite propositadamente um dos problemas fulcrais dos serviços de urgência - o tempo de espera até ao atendimento médico… mas, ao invés de dissecar e analisar de forma mais transparente a questão, recorre a um fait divers: culpabilizar a triagem. 

O Senhor Dr JMS lança mais um dos seus “epílogos” aos Enfermeiros: classifica-os de “profissionais de menor formação”. Pejorativamente, está subentendido.


Segundo afiançou, o caríssimo Dr. JMS, nos seus textos dirigidos a mim, minimizou a importância do conhecimento e experiência dos Enfermeiros da triagem, dando a entender e afirmando que não decidem, não triam, apenas “aplicam protocolos”.

Reiterou, constantemente, que a respectiva triagem não era mais do que meros e cegos protocolos. Porém, o supra-referido jornal, à mesma data, cita-o nesta temática: “o sistema de triagem deve ser aplicado por médicos, pois só os médicos têm formação necessária para se aperceberem dos sinais insidiosos que podem apontar para situações potencialmente mais graves”.

Para quem tanto desdenhou e depreciou os tais meros protocolos, é interessante este seu apetite pela Triagem de Manchester. Já que o Dr. JMS aprecia a virtude democrática da religião, cuidado com a gula. É pecado.

Mas é um apetite que pode suscitar um rasto de curiosidade a algum incauto…

Para que não fique dúvidas, o Dr. JMS lava o prato (e vê-se o desenho do fundo) e remata assim no CM (2013, recordo): “a curto prazo haverá excesso de profissionais médicos no nosso país, pelo que não se justifica que se diminua a qualidade do SNS, o que acontecerá sempre que se recorre a task-shifting (mudança de tarefas entre Médicos e Enfermeiros). E esta mudança acontece, adianta a OM na triagem dos doentes, quando se substitui os médicos por profissionais de menor formação”.


Pronto... assim já se percebe a preocupação do Dr JMS!

Mas, depois de todo este argumento, escreve o Dr. JMS no seu comentário dirigido a mim: “eu sei que há estudos que mostram que os médicos dão mais “erros” que os enfermeiros na aplicação da Triagem de Manchester."
Se sabe que os Enfermeiros cometem menos erros, para que defende os Médicos na triagem? Em honra à qualidade… não é! Certo?!

Isto poupa-me, desde logo, a apresentação de vários estudos muitíssimo objectivos sobre a hegemonia dos Enfermeiros nas triagens (não só de Manchester!) Eu até dispunha de um estudo vasto e sólido onde se conclui que os Enfermeiros têm taxas de sucesso acima dos 95% nas triagens! Difícil de fazer melhor, convenhamos! Fica o estudo na gaveta para uma próxima oportunidade!
Porém, ainda assim (não me dou por satisfeito), decorrente das ideias do Dr. JMS ao jornal CM, há questões que se levantariam:

1. Se o problema não está na triagem, está no atendimento pelo Médicos, que vantagem terá a triagem médica? Todos os cidadãos que comparecem nos SU’s carecem de atendimento; substituindo Enfermeiros por Médicos encurta os tempos de atendimento? Não. O problema continua.
2. Sendo a Triagem de Manchester uma função atribuída consensualmente aos Enfermeiros, tanto longitudinalmente através do tempo (historicamente), como transversalmente pelo espaço (nos países onde está implementada), afinal… a troca de funções é entre quem? Médicos e Enfermeiros? Ou Enfermeiros e Médicos?

Ao contrário do que quer fazer acreditar, a Triagem de Manchester não nasceu só pela mão de Médicos. A sua concepção aconteceu no Reino Unido, através do um grupo de trabalho colaborativo, constituída por Enfermeiros e Médicos; ou seja os Enfermeiros estiveram tanto na sua génese como no seu desenvolvimento e validação (Zimmermann, 2001; JEN/ENA).
Repare como as colaborações entre Enfermeiros e Médicos (sem preconceitos ou pruridos) resultam tão bem!

Capítulo “Força de bloqueio”.

Não haverá muito a dizer nesta matéria. Posso ilustrar a minha perspectiva sobre a matéria da seguinte forma: no domingo à noite, enquanto jantava, assistia à habitual rubrica do Prof. Marcelo Rebelo de Sousa. A determinada altura, o seu discurso captou a minha atenção: “(…) o Bastonário da Ordem dos Médicos opõe-se(…)”.
Eu escuto este “opõe-se” com uma frequência pouco aceitável e intolerável para quem quer ser construtivo. Quando a divisa é “opor, opor, opor”, só podemos pensar que se trata de uma “força de bloqueio”. Simples raciocínio.

Capítulo “Processos Judiciais, responsabilidade e supervisão médica”.

Se o seu argumento com a referência à responsabilidade judicial é tentar amedrontar os Enfermeiros que procuram evoluir através do incremento funcional, então dê o seu tempo como perdido. O exercício profissional dos Enfermeiros também tem essa dimensão implicada. Nada de novo. Funções mais complexas, mais responsabilidade?! Sim, e depois?
Quem se responsabiliza quando as coisas correm mal?” – interroga o Dr. JMS – os Enfermeiros, óbvio! Se não parou no tempo, deverá saber que a responsabilidade do exercício da profissão de Enfermagem cabe só e apenas ao Enfermeiro em questão e ao seu superior hierárquico. 
Em última instância, nas instituições hospitalares, caberá ao Enfermeiro-Director (é por isso que a lei obriga à existência de um em cada Conselho de Administração) e nunca ao Director Clínico. Há décadas que a lei assim o estabelece.

Já reparou no paradoxo? Os profissionais cujo povo mais crê serem subordinados dos Médicos, são precisamente aqueles que têm um representante no Conselho de Administração e não têm qualquer subordinação Médica! Todas as outras classes, exceptuando os Médicos, não têm qualquer representação em tal órgão de poder! Ironias!
No que toca ao quadro regulatório profissional, Portugal está bem desenvolvido, ao contrário de certos países, onde a “supervisão médica” ainda é um conceito prevalente, mas cuja tendência é cada vez mais decrescente. 
Comparando a predomínio conceptual implicado nos últimos 50 anos, facilmente se conclui este facto. Se os Médicos vivem presos ao passado, o problema é de cada um deles (em prejuízo do utente!).

Uma vez mais: uma fracção, cujo numerador é cada vez maior em termos absolutos, de médicos não pensa assim (retrogradamente). Beneficia o cidadão e a Saúde. Para esses seu colegas estou sempre disponível, porque sei que estão sempre disponíveis para mim.

Capítulo “Prescrição de Enfermeiros”.

Se quiser discutir este capítulo com o rigor e profundidade que o mesmo exige, estou perfeitamente de acordo.
Como referiu e muito bem, há países onde os Enfermeiros prescrevem. Em alguns com limitações, noutros com maior liberdade, em certos países sem limitações mas sob “supervisão médica” (o tal conceito que subsiste em alguns países) e, por fim, em determinados países sem restrições e sem supervisão, como prescritores independentes. Alguns exercem e prescrevem de forma autónoma no sector privado e/ou a título independente, inclusivamente.
Com mencionou também, com o devido respeito pela verdade (o que agradeço), na maior parte desses contextos os Enfermeiros fazem-no após um complemento formativo que lhes certifica a competência. Esse complemento em certos países é custeado pelos próprios Enfermeiros (todavia, convém dizer que a competência prescritiva, ao longo dos anos, foi responsável por um considerável aumento remuneratório).
Existem contextos em que os Enfermeiros sem complemento prescrevem, mas uma lista muito restrita de fármacos orais, rectais, inalatórios, colírios, intramusculares e endovenosos (mais apenas dois ou três fármacos por cada via).

Em Portugal, qualquer formação pós-graduada é custeada pelos próprios Enfermeiros (as especialidade também). Infelizmente. Eu sei que aos Médicos lhes é ofertada; mas os Enfermeiros não têm essa benesse.
Regra geral, após o tal complemento formativo, os Enfermeiros adquirem uma espécie de novo título que equivale a significar que detém formação acrescida, mas não deixam de ser enfermeiros. No título existe sempre a palavra “Enfermeiro”. É obrigatório.

Eu defendo prescrição por Enfermeiros, mas condicionalmente. Em 2008, escrevi isto: “Prescrição por diagnóstico de Enfermagem, feita por Enfermeiros Especialistas (e outros Enfermeiros com formação suplementar, experiência mínima e certificação da competência), após formação adequada e com um leque de fármacos indicados para a prática da Enfermagem)”.
Portanto, há coerência nesta matéria. Os planos de estudo de Enfermagem devem ser reajustados para os novos desafios. É óbvio que autonomia no exercício é importante para os Enfermeiros. Interromper a sua actividade para requer “validações médicas” prejudica o exercício da profissão.
Ir "buscar" uma "assinatura" para o que já foi administrado indica uma boa cooperação de equipa, mas também significa que os Enfermeiros são competentes. Nesta âmbito, o International Council of Nurses (ICN), é muito claro ao afirmar que, na globalidade, em todo o mundo "nurses favor expanding their health care responsibilities, including the authority to prescribe medicines to patients" (pode introduzir a citação no google e confirmar).
Já pensou no Enfermeiro Especialista em Reabilitação que diagnostica a necessidade de uma ajuda técnica e tem de recorrer ao médico para a prescrever? 
Já pensou nos Enfermeiros de Saúde Materna e Obstétrica, cuja directiva europeia permite seguir as gravidezes, prescrever alguns fármacos e exames
complementares de diagnósticos?

A directiva, mais cedo ou mais tarde, custe a quem custar (Portugal está obrigado a implementá-la), terá a aplicabilidade na nossa realidade. É apenas uma questão de tempo. Apenas.
Conhece a miríade de estudos que asseguram a qualidade dos Enfermeiros Especialistas em Saúde Materna e Obstétrica?
Vale a pena os Enfermeiros prescreverem? Vale. Nos melhores, mais dinâmicos, versáteis e equitativos sistemas de saúde do mundo, os Enfermeiros prescrevem.
Isto leva-nos a uma interrogação. Há perigo nessa prescrição?


Para percebermos isto melhor, eu pego nas suas palavras, Dr. JMS: “A maioria dos enfermeiros dos cuidados de saúde primários tem funções semelhantes às nossas, em Portugal”. 
Vamos partir daqui, para reduzir o número de variáveis envolvidas. Mesmo contexto, mesmas funções. 
Analisemos os outcomes (resultados em benefício dos utentes) publicados no British Medical Journal, a 15 de Abril de 2000: “On average, nurses have longer consultations, arrange more investigations and follow up, provide more information, and give more satisfaction than general practitioners. Primary care nurses are not cheaper than general practitioners, but they are as safe in managing self limiting illnesses”.

Portanto, cai por terra o preconceito de que a opção de se deve ao custo (não são mais baratos, mas se ler o estudo “they could be more cost effective than general practitioners”) seriam mais baratos, investigam mais e disponibilizam mais informação. É lógico que os utentes se sentem “mais satisfeitos”.
Continue a ler: “there was no significant difference in patterns of prescribing or health status outcomes”.
Aqui, o neutro (e nunca questionado na literatura) Netherlands Institute for Health Services Research não permite grandes dúvidas marginais (esta citação merece uma leitura atenta): “By doing a systematic literature review, the researchers studied 35 scientific publications on the prescribing practices of nurses. They looked for differences in the way nurses and doctors prescribe, in the type of medicines prescribed and in the amounts and the outcomes for patients. 
From the literature study it was clear that nurse prescribing is comparable to prescribing by doctors – nurses prescribe similar types of medicines for similar patients in similar dosages as doctors. The total amount of medicines prescribed by nurses and doctors differs slightly. According to patients, the quality of care was either equal or better in patients whose medicines had been prescribed by a nurse. The researchers found no differences in the clinical outcomes for patients.

Em suma: prescrevem igual, com melhor custo-efectividade e maior satisfação.

O principal argumento médico contra a prescrição é, e sempre foi, a formação (ou o seu “comprimento”). Os Médicos afirmam que a sua formação é mais longa e prepara-os melhores. Para campos exclusivamente médicos (actos cirúrgicos, por exemplo), concordo. Para os leques funcionais sobreponíveis, concentremo-nos nas evidências. 
Não basta dizer que a Equipa A é melhor que a equipa B, porque treina mais horas, faz mais musculação no ginásio, etc, se a equipa B chega ao campo e vence. A formação pré-graduada não é a única contribuição para a construção de uma carreira profissional (entram outros factores).
Presenteio-o com um exemplo paradigmático e exemplar. O caso “Enfermeiros Anestesiologistas contra os Médicos Anestesistas”, que decorreu durente a última década nos EUA e só vi a sua decisão final há dois ou três anos (eu segui o desenrolar dos acontecimentos com todo o interesse).
Sumariamente: o estado da Califórnia decretou que os Enfermeiros Anestesiologistas poderiam anestesiar doentes de forma autónoma e sem supervisão. Os Médicos Anestesistas opuseram-se veemente e recorreram a tribunal. Deixe-me dizer-lhe de antemão, que nesta história toda, a Associação de Hospitais da Califórnia apoiou os Enfermeiros (lá está a gula médica pelo monopólio a pagar caro).
Estudos para cima e para baixo, a coisa não se deliberava (o que de si já é bom sinal, pois os Médicos não conseguiam provar a sua superioridade na qualidade e segurança dos procedimentos anestésicos relativamente aos Enfermeiros). 
Os Médicos apresentaram mais um estudo final e o argumento-coroa mantinha-se: “somos melhores porque a nossa formação é melhor”.

O Juiz pedia para provarem as respectivas asseverações e... nada. Os Médicos mudaram de estratégia. Conduziram as suas alegações no sentido de dizer que em situações de risco eminente, a sua formação era uma mais valia para salvar o doente. O juiz sentenciou que os Enfermeiros podiam anestesiar e sem qualquer supervisão médica.
Os Médicos recorrem ao Supremo Tribunal e os Enfermeiros deram a cartada final. Solicitaram um estudo pormenorizado e em detalhe rigoroso acerca de toda a casuística ocorrida na base de dados da “Medicare” (como sabe, com dados próximos da grandeza dos milhões). Queriam perceber se existiam diferenças entre os procedimentos anestésicos de Enfermeiros e Médicos e, sobretudo, como é que o erro variava, especialmente em situações de perigo de vida eminente. A fiabilidade da “população em estudo” era avassaladora comparada com os estudos invocados pelos Médicos, pois os Enfermeiros suportavam-se nos dados da realidade estabelecidos num interessantíssimo espaço de tempo.
A conclusão foi inequívoca: os Enfermeiros anestesiam tão bem ou melhor quanto os médicos e resolvem todas as situações de risco tão bem ou melhor. Está claro – os Enfermeiros venceram no supremo, a última instância da esperança médica.
Actualmente, algumas associações médicas dedicam-se a publicitar outdoors (e outras campanhas "minor") contra os Enfermeiros; sem sucesso.

Na Califórnia, como em vários estados, os Enfermeiros anestesiam sem qualquer supervisão Médica. Curioso é que não existe, qualquer diferença de qualidade e segurança entre os estados onde não existe supervisão e onde existe. Ou seja, a supervisão médica, neste campo em especial, é irrelevante. Ainda assim, apesar de tudo, há Enfermeiros e Médicos que se unem para formar equipas de anestesia.

A sentença é pública. Consultável. Exemplar.


Capítulo "Exames Complementares de Diagnóstico com ponto de partida na triagem".

Já é procedimento com sucesso nas vias verdes. Fico sem perceber o seu ponto de vista.
Para clarificar melhor, recorro uma vez mais a dois conhecidos estudos que avaliam precisamente este item (exames complementares de diagnóstico solicitados no acto da triagem).
Como um estudo tem necessidade desse centrar em algo específico e mensurável, vamos avaliar, por exemplo, a requisição de Raios-X (uma vez que o ECG é ainda mais linear) na eficiência da gestão assistencial dos SU’s. O que equivale a afirmar que se procederá se o contributo dos Enfermeiros neste âmbito é válido (ou não). Um estudo científico é sempre criticável, mas configura-se sempre como uma ajuda que suporta uma decisão e a corrobora (ou não) uma posição.
Deixo os títulos e as conclusões sumárias:
Triage nurse requested x rays—are they worthwhile?” (J Accid Emerg Med 2000)
Conclusion: “A triage nurse x ray requesting system speeds up the progress of walking wounded patients through the department without compromising service quality”. Este tem um desenho (uma espécie de diagrama).

“Título: "Nurse-initiated x-ray of isolated limb fractures in the emergency department: research outcomes and future directions." (Aust Crit Care. 2002 )
Conclusão: "(...) high correlation has been found between doctors' and nurses' ordering of x-rays (…)The findings from this literature review suggest that extending the triage role to include nurse initiated x-rays has the potential to decrease waiting times and to increase patient satisfaction in the emergency department.
To improve patient satisfaction and decrease waiting times for some patients, the literature suggests that nurse initiated x-rays at the point of triage may be of value".


Capítulo “Discussões, confusões e discussões”.

“Aos enfermeiros que se orgulham da sua profissão e com quem tenho trabalhado, esta discussão passa completamente ao lado e percebem que não têm sido bem representados pelos seus “representantes”.
Isto é uma boa forma de dizer que os Enfermeiros que se acometem a um canto, sem questionar, sem mostrar sentido crítico, são os que mais lhe convém. Há que controlar as águas para perseguir certos objectivos. Se não resulta com a estratégia do elogio bondoso, o Dr. JMS e alguns médicos recorrem a outra estratégia: do ataque humilhante – que vai desde apelidarem os Enfermeiros Mini-Médicos, Médicos de Segunda (também assim apelidou, porque deu jeito, os seus futuros colegas da Universidade do Algarve e de Aveiro), frustrados, etc.
Lá porque a população de cor negra (a qual respeito) solicita os meus direitos, responsabilidades e dignidade da população de cor branca, tal significa que os negros querem ser brancos? Apelidamo-los de brancos de segunda ou frustrados?!? Se compreende a analogia, a resposta é um retumbante “é óbvio que não”.
Se essa estratégia tem algum efeito sobre as pretensões de alguns Enfermeiros, devo admitir-lhe que sobre mim isso não tem qualquer efeito. Pode bem apelidar, desconjurar, maltratar, se assim o entender. Para mim, palavras, leva-as o vento. Sou perfeitamente imune.
Já que se fala em vento, lembrei-me de "googlar" (copiei-lhe o hábito, ironicamente!) sobre a percepção dos portugueses sobre a sua pessoa. 
A minha pesquisa é tão tendenciosa na amostra, que vale o que vale, ainda assim, tem a sua pertinência. E como iniciei o parágrafo com o vento, vou a blog Aventar (06/09/2011): “O senhor Bastonário da Ordem dos senhores doutores médicos ao ver que o senhor ministro queria tocar nas intocáveis despesas do SNS (…) assim, defende o senhor Bastonário da Ordem do senhores doutores médicos, que com mais este impostozito, já não seria preciso fazer cortes nos serviços, já que quem come comida de plástico iria pagar o que os senhores doutores médicos não entendem dever poupar”.

Para garantir a sustentabilidade do SN é preciso poupar. Em que podíamos poupar? Uma vez mais, dou a voz um cidadão (por sinal Presidente da Câmara Municipal de Vila Real de Santo António): “é "sintomático" que o Bastonário da Ordem dos Médicos não comente os contratos de prestação de serviços sistematicamente mantidos pelo Serviço Nacional de Saúde com algumas empresas que agenciam médicos, "esses sim com preços absolutamente pornográficos e com resultados e desempenho desconhecidos".
Na mesma peça jornalística (algarveprimeiro.com, a 18/08/2014), constatei outro facto interessante: quando dá jeito, o senhor bastonário defende que segundo a OCDE, Portugal tem muitos Médicos; quando já jeito, refere que é preciso contratar mais médicos. Como não há Médicos a responderam as concursos, presumo que não estejam em casa desempregados (já devem ter o seu emprego), significaria que Portugal precisa de formar ainda mais.

Continuando, no “Observador” (06/07/2014) reza assim (da autoria do ex-Director do Público, ex-aluno de Medicina): "O bastonário da Ordem dos Médicos tem vindo a transformar-se numa versão caricatural do sindicalista de bata branca e estetoscópio, sempre a falar do SNS mas sem nunca esquecer uma agenda corporativa. Quase não há dia que passe sem que nos entre pela casa dentro o ilustre bastonário".

Adiante: “está sempre zangado, quase sempre indignado e também ele já nos anunciou tantas vezes que o Serviço Nacional de Saúde estava em vias de acabar que só esperamos que seja mais certeiro quando faz o diagnóstico dos seus doentes. Porque nem o SNS acabou, nem vai acabar".

Só mais um pouco: “A clivagem entre o sindicato independente, de um lado, e o sindicato próximo da CGTP, do outro lado, e o alinhamento da Ordem com a organização sindical mais radical e mais previsível – no sentido em que acusaram, acusam e acusarão todos os governos de “destruírem o SNS” – é muito significativa. Mas é apenas um indicador da deriva recente da organização dirigida por José Manuel Silva. Se lermos o comunicado que emitiram esta semana a apelar à greve e à manifestação encontraremos uma diatribe contra tudo e contra todos, escrita num tom exaltado e desequilibrado”.
Concluindo (porque não quero transcrever mais): “Há no entanto uma passagem no comunicado que é muito reveladora sobre as preocupações da Ordem. Escreve-se aí: “o Ministério tem patrocinado uma intensa campanha contra a dignidade de todos os médicos, usando os casos de alguns, que devem ser exemplarmente punidos, com notícias repetidamente transmitidas na comunicação social”. Eu traduzo: a Ordem está incomodada por terem sido apanhados médicos nas operações de combate à fraude no SNS”.

Capítulo “Diagnósticos de Enfermagem”.

Cito-o: "diagnósticos de enfermeiros (um conceito muito indefinido...)".

Eu aqui podia afundá-lo em argumentos. Se lesse um pouco sobre Fundamentos de Enfermagem, eu aceitaria discutir isto consigo. Porém, a sua afirmação, só por si, é reveladora. Além disso, é uma mostra do (des)respeito que tem pela Enfermagem.

Capítulo “Pré-hospitalar”.

Mencionou o Sistema de Saúde Alemão, que não é exemplo de nada. A Alemanha pode ser em exemplo económico, mas na Saúde é um mediano/bom. Desde do ano 2000 que a OMS não produz rankings, deixando essa tarefa ao arbítrio de outros. Conforme a organização que ordena a classificação, os primeiros lugares vão variando, mas nunca lá vi a Alemanha. Vi, por exemplo, a Suécia. Um óptimo e rentável sistema, onde os Enfermeiros têm funções acrescidas e a quem não há dedo que se aponte em matéria de saúde e social. Se tem algo a apontar, faça favor.
Mas antes de prosseguir, faço um (grande) reparo. Vou citar o seu comentário orientado à minha pessoa: “Finalmente uma outra afirmação correcta emitida por si: “As funções dos Enfermeiros não são intemporais. Variam de país para país, variam no tempo, variam institucionalmente, variam em função da formação, variam de acordo com as necessidades das populações, etc. As competências de hoje não são as de outrora e não serão do futuro.” Logicamente, é uma verdade de La Palisse, acontece o mesmo em todas as profissões!!! Acho que ninguém se admira com esta realidade!!!
Portanto, desconstrói e inviabiliza o meu argumento, classificando de “verdade de La Palisse”. 

Todavia, é interessante como vai repescar agora um dos exemplos da "verdade de La Palisse", para sustentar o seu. Em filosofia, nas cadeiras de lógica e argumentação, isto é digno de chumbo. É um erro crasso. Ainda assim, desportivamente, aceito.

Não sei quem lhe contou a realidade alemã, bem como o status da Enfermagem alemã. Muito sucintamente: as colheitas de sangue são uma tarefa atribuídas aos Médicos, comumente executada pelos Enfermeiros (cansados de esperar). 

Os Enfermeiros intubam, algaliam, executam pensos, etc. Nos Cuidados Intensivos, os Enfermeiros solicitam análises laboratoriais, ajustam ventiladores, etc, mas uma vez mais varia de instituição para instituição, mas sobretudo varia até entre o território da Ex- República Democrática e República Federal.

Mas isto lança uma questão interessante: qual é a vantagem dos Médicos na colheita de sangue? Executam melhor? Menos intercorrências? Melhores amostras? Resultados mais fidedignos? A resposta é básica.
Em Portugal muitas classes partilham esta função, sendo que os Enfermeiros, pela experiência, são muito solicitados para encontrar aquela vénula que ninguém mais encontra.

A Alemanha é um mau exemplo para a Enfermagem. Não tem qualquer quadro regulatório, reinando a anarquia. A legislação enformadora é escassa. 
Não obstante, confirma o meu argumento, caro Dr. JMS, que eu volto a reproduzir: “As funções dos Enfermeiros não são intemporais. Variam de país para país, variam no tempo, variam institucionalmente, variam em função da formação, variam de acordo com as necessidades das populações, etc”.

Um exemplo interessante: Canadá. Há um punhado de décadas, era necessário um médico para dar uma simples intra-muscular. Desde então, o contexto evoluiu tanto, que os Enfermeiros, prescrevem, solicitam exames, etc, etc. Evoluíram assim para umas das melhores Enfermagens do mundo!

Voltando, ao tema do capítulo – Pré-Hospitalar.

Helicópteros tripulados por Enfermeiros e Bombeiros. Viu alguma instituição representativa de Enfermeiros defender este modelo? Eu não. Vi-os defender a equipa Médico-Enfermeiro. Se me provar o inverso, aceito.
Interessante como apresenta os protocolos no pré-hospitalar como um solução atractiva, mas quando o raciocínio se aplica aos Enfermeiros, os defeitos e perigos aparecem subitamente. Não se importa (e defende) que uma profissão, cujo requisito de admissão é o 12º ano de escolaridade actue sem presença médica, mas opõe-se (opõem-se, opõem-se, opõem-se) aos protocolos e alargamento funcional dos Enfermeiros.
A esta contradição de raciocínio, o povo descrever como “não bate a bota com a perdigota”. Os protocolos são bons para os outros, mas para os Enfermeiros são maus. Isto é, se forem os Médicos a executá-los (como no exemplo da triagem), já são bons de novo. Eu acho que o senhor se baralha a sai próprio.

Cito-o, novamente: “Factualmente, como vê, em sede judicial os técnicos foram “avalizados” e foi-lhes permitido executar determinadas técnicas life saving depois de devidamente treinados.”
.
Onde está isso escrito, Dr. JMS? O que está, era o que havia, por assim dizer. O Despacho 9958/2014 teve efeitos suspensivos sobre tudo o que estava previsto.

Ainda assim, repare no seguinte. A maioria das ambulâncias tripuladas por técnicos está sobreposta com a rede VMER (estranho!), o que significa que há Médicos e Enfermeiros disponíveis e uma rede hospitalar perto. 

Se as ambulâncias estivessem no interior, eu questiono: sem casuística que justifica a manutenção de competência, os TAE como vão fazer? Os Enfermeiros treinam imenso no contexto hospitalar, ou na rede SIV, nos SUB’s, mas os TAE não. Arrisca a sua vida em alguém que punciona de vez em quando (olhe, eu não!) ou execute um procedimento de longe a longe? Olhe, eu confio essas coisas aos senhores enfermeiros e doutores.


O Modelo de Pré-Hospitalar proposto pela Ordem dos Enfermeiros não é centrado nos Enfermeiros, tal como o senhor bem sabe (a hipocrisia dificulta o “debate”). É centrado nas duas classes que a lei prevê como únicos que podem executar Suporte Avançado de Vida: Médicos e Enfermeiros.
A Ordem dos Enfermeiros não tem obrigação de apresentar nada aos Médicos. A Ordem dos Médicos tem jurisdição sobre os Médicos. A definição das políticas de saúde cabe apenas à tutela. Para quantos projectos/propostas é que a Ordem dos Médicos bateu à porta dos Enfermeiros? Zero.
Reitero a minha posição inicial: todos os intervenientes deveriam convocados para a discussão, moderada pelo próprio Ministério, como é facilmente compreensível. E foram, mas a certo ponto (escassez de argumentos!) o Dr. JMS deixou de se apresentar…

Passo a cita-lo: “Só tenho pena que chegue ao fim do seu mandato sem elaborar o que a própria CEM se tinha proposto e para o que lhe foram dadas as condições solicitadas: elaborar um plano integrado para o pré-hospitalar”.
Segundo consta, não apresentaram porque a perspectiva deles sobre o pré-hospitalar é substancialmente diferente da sua. A incompatibilidade leva à infertilidade. Pese o facto, nunca a irão apresentar. Irremediavelmente.

Se prefere um modelo com técnicos de emergência na rua, os seus colegas podem agradecer-lhe, uma vez que esses modelos tendencialmente, esvaziam a presença de médicos na rua. Para o seu exemplo, em particular, convém dizer que os Técnicos dispõem de uma formação muitíssimo superior à dos nossos, cujo enquadramento é mais próximo dos Enfermeiros. Mas se em Portugal temos Enfermeiros suficientes, para que queremos Técnicos? Não há evidências que sejam melhores que os Enfermeiros!

Portanto, como vê, é uma argumentação circular. Se escolher esse caminho, vai girar como um carrossel.

Se me responde ou não, o problema já não é meu.

Aceite os meus respeitosos cumprimentos.

sábado, janeiro 17, 2015

Entretanto, no Facebook...

... o Bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, entra na discussão dos Enfermeiros!
.
.
RESPOSTA AO BASTONÁRIO DA ORDEM DOS MÉDICOS 
(perante o seu comentário que a imagem ilustra)
.
Caro Doutor José Manuel Silva, permita-me então que, numa lógica contributiva entroncada numa perspectiva construtivista, responda ao seu desafio. Confesso-lhe exactamente a mesma incredulidade que mim me expressou: não consigo compreender a sua posição, bem como de uma porção de Médicos.
Congratulo-me ainda assim, por saber que a uma fatia muito substancial da corporação médica portuguesa partilha, juntamente com os Enfermeiros, de uma filosofia de melhoria de cuidados realmente centrada no doente/utente, ao invés de colocar “interesses médicos” a servir de força de bloqueio (médico-centrismo), disfarçados de “preocupações com a qualidade e segurança”, com o objectivo de iludir o povo desinformado e à mercê destas “guerras”.
Uma nota próloga: assuntos de Enfermagem cabem apenas aos Enfermeiros. É uma profissão tão auto-regulada quanto a profissão médica.
Antes de prosseguir, uma nota explicativa acerca de algumas referências a estudos e evidências invocadas por mim. Por uma questão de sumarização não faço menção ao autor e título. Se, porventura, alguém, devidamente interessado numa discussão construtiva, pretender conhecer qual a referência em questão (por dúvidas de qualquer índole), poderá solicitar a mesma por mensagem privada e eu faço questão de publicar abertamente. É esta a minha postura habitual.
Assim, objectivamente, ponto-por-ponto:
1 - A triagem de prioridade de Manchester não se consubstancia como uma mera aplicação protocolar desprovida de discernimento e capacidade de juízo clínico no que concerne ao profissional que a realiza.
Rege-se num plano algorítmico porque um dos pressupostos basilares do instrumento é a fiabilidade e replicabilidade. Não obstante, cabe ao triador a observação e interpretação de sinais/sintomas e activar um conjunto de discriminadores protocolados. É precisamente na introdução a informação para o sistema que podem acontecer variações, erros, etc.
Porém, isto não é linear, uma vez que múltiplos estudos, onde é estabelecida a comparação entre Enfermeiros e Médicos, concluem que existem, frequentemente, diferenças na atribuição de prioridades. Isto leva a considerar que existe “subjectividade” inerente ao processo. Relembro que, os Enfermeiros têm melhores resultados na respectiva triagem, errando menos. Beneficia o cidadão
Acrescento que, de acordo com um conhecido estudo português, quem manifesta mais satisfação com a triagem realizada pelos enfermeiros… são os próprios médicos.
Uma nota final para os cursos de formação relativos à triagem de manchester, onde, uma vez mais, os enfermeiros se classificam melhor.
Não é, obviamente, uma ferramenta de diagnóstico, nem será isso que se pretende (estaria condenada ao fracasso de for encarada dessa forma).
São protocolos? São. Todavia, se caso o triador fosse médico (como defende o seu colega, Presidente da Secção Regional do Norte da OM) usaria exactamente o mesmo protocolo (não vá a população que se o triador fosse Médico não se sujeitaria ao mesmo protocolo!). Portanto, o Médico nada acrescentaria ao processo; pelo contrário, o processo de triagem corria o risco de se enviesar.
A título do curiosidade: tenho a certeza que está familiarizado com outros sistemas e níveis de triagens, onde inclusive o Enfermeiro procede a uma observação mais profunda do utente e dá início a processos terapêuticos complexos.
2 - Neste ponto, o seu argumento é tão aplicável ao Enfermeiro como ao Médico (o que profissional que lá estiver tem de aplicar os protocolos). Porém, sim, confirmo e há que recordar que os resultados obtidos pelos enfermeiros, bem como os ganhos em saúde que daí decorrem são inequivocamente excelentes. Beneficia o cidadão.
O seu problema (o juízo é meu, admito...) prende-se com as palavras “pedir/solicitar exames”? É que com a exaustão com que tenta esclarecer esse pormenor parece-me que os seus receios são outros.
Se reflectirmos com atenção percebemos que a prática médica não é tão “livre” como poderá pensar. Nos dias que correm rege-se por guidelines, normas de orientação, protolocos analíticos, farmacológicos, etc. Portanto, em muito boa parte, cumprem o que está definido pela ciência e conhecimento actual.
Repare que, como deve ser do seu conhecimento, em várias instituições, a solicitação de exames complementares de diagnóstico está confinada e condicionada a um conjunto de critério. Outro exemplo: a terapêutica farmacológica segue a padronização preconizado, muitas vezes com suspensões farmacológicas sem indicação médica, executadas por outros profissionais, alicerçadas no âmbito da normalização científica.
Este procedimento deveria ser prática generalizada ao nível de todo o sistema, no sentido de nivelar eventuais práticas díssonas – não é por acaso que Portugal está no “pelotão do fundo” que toca à prescrição e uso de antibióticos, com as resistências a crescer exponencialmente (bem como os custos) e a saúde dos cidadãos a decrescer.
3 - Relativamente à carreira dos técnicos do INEM: existe e não coloco em causa a sua necessidade. A minha discordância prende-se com as atribuições funcionais que muitos desejam dotar os referidos técnicos.
Recordo-me de assistir à presença do Dr. José Manuel Silva, num programa televisivo da RTP (assumia ainda o cargo de Presidente da Secção Regional do Centro da OM). Atestou, se bem se recorda, à data, sérias preocupações de segurança inerente à prestação de cuidados pelos Enfermeiros das SIV do INEM, concretamente na execução de protocolos, chegando mesmo a colocar em causa a competência dos Enfermeiros em questão (não podia ainda deixar passar em branco o facto ainda ter quase apelidado os Enfermeiros de ignorantes, ao declarar os cuidados a ter com a administração de morfina - “a morfina mata” - como se quem administrasse as morfinas e conhece as suas indicações, contra-indicações e efeitos secundários, não fossem os Enfermeiros!).
O povo, leigo, com estas mensagens subliminares (que são características do Dr. José Manuel Silva) poderá ter suposto que poderiam estar em perigo nas mãos dos Enfermeiros.
Volvidos uns anos os tais técnicos do INEM já podem, mediante protocolos e supervisão médica, avaliar, intervir, puncionar, administrar fármacos endovenosos, etc. Manifestou as suas reservas quanto aos Enfermeiros, mas aceita e apadrinha que uma classe - cujo requisito de entrada na profissão é o 12º ano de escolaridade – possa desenvolver competências que são reconhecidas aos Enfermeiros.
No mínimo… estranho. Se realmente está desassossegado e preocupado com os doentes do interior (que não tem acesso a Médicos/Enfermeiro), então, em oposição àquilo que defende, seria muito mais coerente que propusesse a ampliação da rede pré-hospitalar devidamente dotada de Enfermeiros. Se bem se recorda, inclusivamente em sede judicial, essa sua posição foi condenada moralmente, por passar a mensagem que para os portugueses do interior, qualquer “coisa" serve.
Existe a possibilidade de dotar de recursos de Enfermagem todo o território português. Beneficia o cidadão. Se Dr. José Manuel Silva, de facto, está interessado no cidadão, não tenho a menor dúvida que prestará o seu apoio aos Enfermeiros do pré-hospitalar.
Esclareça-me: consta que a sua posição nesta matéria não tem a concordância dos seus colegas da competência de emergência na OM, motivo pelo qual estão demissionários. Isto corresponde à verdade?
4 - Neste ponto em particular, o seu argumento padece de várias fragilidades. A OE apresentou uma proposta de modelo integrado para o pré-hospitalar, é certo. Foi concebida dentro daquilo que é a perspectiva da OE sobre o tema.
Contudo, não cabe à OE apresentá-la à sua homónima médica (relembro que a OM nunca apresentou nada à OE, porque haveria de acontecer o inverso, principalmente quando a OM habitualmente se opõe a todas e quaisquer propostas dos Enfermeiros…?), uma vez que a OE não é organismo que tutela a pasta da saúde.
Se a Ordem dos Médicos pretendesse, de facto, cooperar, apresentava o seu modelo ao Ministério da Saúde e estou certo que todos os intervenientes seriam convocados para a discussão, moderada pelo próprio Ministério, como é facilmente compreensível.
Bem sabe que a OE e todos os Enfermeiros estão sempre disponíveis para o diálogo.
O que aconteceu de facto foram algumas reuniões avulsas, onde a Ordem dos Médicos (aliás, o Dr. José Manuel Silva) se apresentava intransigente, quanto a Ordem dos Enfermeiros procurava discutir e procurar soluções exequíveis e sustentáveis que respondessem às necessidades dos cidadãos. A certo ponto, sem argumentos defensáveis apresentados pela OE, o Dr. José Manuel Silva deixou de comparecer…
5 – Solicitar exames complementares de diagnóstico (e administração de analgesia) no momento da triagem não é uma novidade a introduzir pelo Ministério da Saúde português. Já é uma realidade adolescente em vários países, com excelentes resultados. Qual é o problema?
Os estudos revelam que os exames são correctamente solicitados e a administração de fármacos não enferma de erros. Portanto, as evidências estão unanimemente do lado dos Enfermeiros. Beneficia o cidadão, que vê o acesso aos cuidados ser mais rápido, confortável, orientado por elevados padrões de qualidade.
Não vou discutir consigo formações-base (Enfermagem/Medicina) até porque cada profissão tem o seu objectivo e a formação-base é apenas o princípio de longas carreiras de formação pós-graduada e contínua, experiência profissional, aprendizagens, etc.
Os Enfermeiros vão ajustando as suas competências de forma a corresponder às necessidades de saúde dos cidadãos.
É por isso que as competências variam em função do tempo (as nossas competências do presente são diferente das do passado e serão, certamente, diferentes das do futuro), das necessidades dos cidadãos, da autonomização dos Enfermeiros face ao contexto e até variam de instituição para instituição.
Em determinadas instituições são assumidas como competências dos Enfermeiros o que noutras se assume como competências medicas (se bem que o conceito de competência é complexo).
6 – O Despacho do Senhor Secretário e Estado é bem mais abrangente do que isso, Dr. José Manuel Silva. Pretende, antes de mais, regularizar, uniformizar, prevendo a execução de auditorias que permitam normalizar processos de triagem.
Possibilita que os Enfermeiros rentabilizem as suas competências (solicitando exames e administre analgesia) contribuindo para o cumprimento dos tempos de espera e as priorizações sejam fiáveis, para que o utente não agonize horas a fio em frente aos olhos de todos (inclusivamente para que não morram à espera do Médico).
Os exames complementares de diagnóstico não serão solicitados nos moldes que o senhor quer fazer transparecer. Não servem para o enfermeiro diagnosticar. O seu objectivo é melhorar comprovadamente a eficiência do SNS (que todos nós tanto defendemos, incluindo o senhor) e respectiva resposta.
Se um utente recorre a um SU com queixas de “dor no peito”, para quê arriscar vidas a aguardar que o mesmo seja visto por um médico, para que posteriormente solicite um ECG (por exemplo), a ser realizado realizado, para que, ainda depois, seja avaliado por um médico… se o doente pode já chegar com o ECG pronto?! Os Enfermeiros existem para servir os utentes e poupar vidas.
O encurtamento de tempos (door-to-physician) é um excelente contributo (podem salvar vidas, incluindo a minha e a sua).
Se as evidências não acompanhassem toda esta argumentação, vidas humanas poderiam estar em risco; mas as evidências apoiam estes procedimentos. Beneficiam os utentes.
7 - Agradecia a bondade de me apresentar dados objectivos e mensuráveis que corroborem a sua afirmação. Eu tenho evidências que corroboram o contrário, sem margem para dúvidas. Apresento-os com todo o gosto, como forma de rebater as suas, se as apresentar.
A argumentação do comunicado da OM resume-se a isto: “o pedido de realização de exames complementares de diagnóstico no contexto geral do MTS deverá ser enformado por uma presunção clínica de diagnóstico até porque, estando em causa exames que importam a ofensa à integridade física do doente e que, em alguns casos, importam riscos para essa integridade”.
Ora, no MTS (vulgo triagem de Manchester), o pressuposto é a ausência de diagnósticos (ainda que sejam presumidos apenas). Serve apenas e só para priorizar. Diagnosticar no momento da triagem condena a mesma ao fracasso, conforme atesta a sustentação científica.
O que se pretende é já vulgar noutros países – o enfermeiro tria, solicita o exame que tenha correspondência(em consonância com a queixa/motivo de ida ao SU) e a informação segue para o médico, para que se inicie o processo diagnóstico.
Reitero que os estudos que existem nesta área confirmam a utilidade desta medida e a ausência de erro significativo dos Enfermeiros. Beneficia o utente. Tenho dificuldade em perceber a sua perspectiva, que confesso-lhe me parece mais de cariz corporativo. O senhor tem receio da contribuição dos Enfermeiros? Eu sei qual é o seu receio.
8 – Discordo de si quando refere que faltam Médicos. Temos muito mais Médicos do que a generalidade dos países. Temos é os enfermeiros pouco rentabilizados. O sistema demasiado centrado e afunilado no Médico não é essencialmente dinâmico e oneroso, não devido aos salários dos médicos, mas devido ao excesso de médicos (e consequente medicalização com tudo aquilo que acarreta).
O sistema está encarcerado num efeito bola de neve, cada vez mais pesado e oneroso e demasiado convergente.
A solução é a contratação de mais Médicos? Não partilho integralmente dessa opinião. Com tantos Médicos um dia não temos lugares para os utentes.
Em vários países o utente é admitido no SU, triado, observado, avaliado medicado, reavaliado e tem alta sem nunca ver um médico. Ninguém ainda provou que os Enfermeiros cometem mais erros e prestam cuidados de menor qualidade. Pelo contrário.
Atenção: se em todo este processo o Enfermeiros vislumbrar a necessidade de observação médica, requererá um clínico.
O Senhor Bastonário pode (e deve!) consultar os exemplos dos melhores sistemas de saúde do mundo. Muitos dos seus colegas vão lá estagiar com os Enfermeiros. Um dos seus mais reputados obstetras, há alguns anos atrás, foi à Suécia, aprender com os Enfermeiros.
Ao que consta, retornou muito mais enriquecido, inclusivamente no campo na imagiologia e da cultura de gestação e partejamento.
Não há sistemas perfeitos, mas podemos constatar uma correlação muito significativa com a qualidade e sustentabilidade do sistema, com o factor “rentabilização” dos Enfermeiros.
Tal como também demonstram vários estudos, nomeadamente ingleses, os Enfermeiros nem sempre são uma opção mais barata, mas constituem-se como uma opção de custo-benefício muitíssimo interessante.
Existem até estudos que comparam Médicos e Enfermeiros na realização de colonoscopias!!
Note que os Enfermeiro até diagnosticam melhor e com menor taxa de erros (embora os Enfermeiros aqui sejam mais caros), dentro dos diagnósticos comparados (estou apenas a limitar-me a reproduzir a conclusão do citado estudo). Nesse campo, eu discordo - Medicina para Médicos e Enfermagem para Enfermeiros, embora sem grande estanquicidade funcional.
Os tempos evoluem, as competências devem acompanhar. Temos de deitar por terra a ideia que os Enfermeiros são preferenciais porque são mais baratos. Não é verdade. O factor vencimento não é a única parcela do cálculo. Se fosse, mesmo sabendo que a média salarial médica é superior à da enfermagem, relembro que um Enfermeiro mais experiente pode auferir mais do que médicos até certo ponto da carreira.
9 – Se o Dr. José Manuel Silva realmente acreditasse no que afirma neste ponto, nunca defenderia os técnicos do INEM.
Ainda assim, relembro, com insistência, que as funções dos Enfermeiros não são intemporais. Variam de país para país, variam no tempo, variam institucionalmente, variam em função da formação, variam de acordo com as necessidades das populações, etc. As competências de hoje não são as de outrora e não serão do futuro.
O conceito de skill-mix/task-shifting (não têm o mesmo significado) implicam práticas apoiadas por diversos organismos representativos da saúde, incluindo a OMS.
Existem vários estudos sobre esta matéria, onde os Enfermeiros, em traços gerais, comprovam as suas capacidades. Se assim não acontecesse, então resignar-me-ia perante as evidências; porém, enquanto as evidências estiveram do lado dos enfermeiros não vejo a razão pela qual os enfermeiros não devem prestar um maior contributo.
Reitero: a Enfermagem não é uma profissão imutável. Tal como não são as outras.
Há uma questão que pretendia clarificar e desmistificar: o argumento de que Médicos e Enfermeiros podem partilhar muitas funções e competências, é válido para Médicos e Enfermeiros (e em algumas situações, para a tríade Enfermeiro-médico-Farmacêutico. Por exemplo, os Farmacêuticos no Reino Unido prescrevem tão bem quanto Médicos e Enfermeiros).
Conforme comprovam vários estudos, esta sobreposição competencial não resulta da mesma forma entre outros profissionais (motivos: formação académica muito díspar, contextos de prática distintos, experiência profissional, percurso formativo pós-graduado). A explicação para este efeito é que o binómio Enfermeiro-Medico partilha uma parte substancial da sua prática e percurso. Resumindo: o argumento não é extrapolável para outras classes.
Os pontos 10 e 11 estão respondidos anteriormente. Contudo, permita-me que lhe diga que a prescrição de alguns fármacos por Enfermeiros são úteis para a prática autónoma da profissão, desde que a prescrição decorra de diagnósticos de enfermagem. Parafraseando o Netherlands Institute for Health Services Research, “a pill from the nurse is just as safe as a pill from the doctor”. Uma vez mais, existem um rol de evidências que confirmam e suportam esta afirmação.
A prescrição às “alminhas” (mais conhecidos como SOS’s – acrónimo inglês de “Save Our Souls”) revelam isso mesmo. São fármacos, como sabe, cuja administração que fica à consideração dos Enfermeiros (mediante as avaliações do quadro de saúde – dores, valores tensionais, quadros de agitação, ansiedade, estados inflamatórios, respiratórios, etc, etc).
O paracetamol é um medicamento não sujeito a receita médica, contudo, existem colegas seus – veja lá! – que ainda ficam indignados quando Enfermeiros administram paracetamol sem a devida prescrição!! Isto é inqualificável!
Conhece aquele famigerado estudo que demonstra que 86% dos erros de prescrição médica são detectados pelos Enfermeiros? O mesmo demonstra que os Enfermeiros não só corrigem os erros médicos, como têm capacidades prescritivas.
Os Médicos devem perspectivar o Enfermeiros como parceiro de cuidados. Contudo, parece-me que em certas situações os perspectivam como inimigos. Isto favorece o SNS? Favorece o cidadão?
O ponto 12 está respondido em toda a argumentação encimada. Discordo de si.
A aposta na rentabilização dos Enfermeiros não é uma questão de redução de custos directos (o que nem sempre acontece). É uma questão de investir em ganhos em saúde. Esses sim, têm um retorno económico que permitem a sustentabilidade, aliada à qualidade e segurança da assistência em saúde.
Deixo-lhe agora o meu mote para um desafio: se, de facto, pretende um sistema de saúde dinâmico, sustentável, qualitativamente superior, adaptado às necessidades da população, sente-se à mesa com os Enfermeiros num espírito de construção e contribuição efectiva!
Aceite os meus cumprimentos.

This page is powered by Blogger. Isn't yours?

AmazingCounters.comVisitas ao blog Doutor Enfermeiro


tracker visitantes online


.

Novo grupo para reflexão de Enfermagem (a promessa é: o que quer que ali se escreva, chegará a "quem de direito")! 

Para que a opinião de cada um tenha uma consequência positiva! Contribuição efectiva!