quinta-feira, março 22, 2012

Médicos criticam Enfermeiros: a polémica dos partos no domicílio...

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(Parte 1)

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(Parte 2)

No fulcro de todo o barulho está mediatização dos Enfermeiros e sua exigência para a autonomização das suas funções enquanto parteiros, consignadas em directivas europeias e transpostas para o direito português, mas que, inexplicavelmente, continuam apráxicas.
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Depois da interessante alusão da SIC ao tema partos no domicílio, no programa Boa Tarde, onde esteve presente a Enf. Lúcia Leite, Especialista em Saúde Materna e Obstétrica, actual Vice-Presidente da Ordem dos Enfermeiros, e das declarações corporativistas do Dr. João Carvalho, Presidente do Colégio de Ginecologia e Obstetrícia da Ordem dos Médicos...

"Os obstetras criticam o facto de os enfermeiros estarem a fazer publicidade em relação aos partos em casa, uma prática que os médicos obstetras entendem ser arricada e um «regresso à Idade Média».

«Portugal conseguiu uma baixíssima taxa de morbilidade e mortalidade maternas e neonatais, uma das melhores da Europa, senão a melhor, à custa de uma assistência hospitalar altamente qualificada».

Este responsável lembrou ainda que os enfermeiros que estão a promover o parto no domicílio são «pessoas pouco qualificadas, sem qualificação nenhuma ou escassa para poder assistir ao parto de forma autónoma e muito menos para assistir ao recém-nascido»"

... convém dizer o seguinte:

1. Existe uma confusão patente entre os conceitos "natural" e "domicílio". Muitíssimos Enfermeiros, onde eu me incluo, defendem o parto natural, nos casos previstos, sem contra-indicações que comportem riscos associados. 
Parir no domicílio consubstancia uma prática diferente, principalmente em Portugal, país atrasadote neste âmbito, por pressão médica. Não existe qualquer quadro legal que regulamente o mesmos. 
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Não se disponibiliza aos Enfermeiros a tal autonomização prevista na Lei (que prevê a requisição de exames de diagnóstico e prescrição de fármacos, permitindo cumplicitamente que o parto se vigie sem "olhos internos"). Portanto, para que não existam equívocos: não se disponibilizam meios adequados para a execução do procedimento; não se disponibilizam contextos hospitalares cuja ambiência seja idêntica ao espaço familiar.  
O desejo de parir em casa deve ser analisado caso-a-caso, mediante critérios rigorosos, entre eles os de risco clínico, para que o único risco não controlado seja o que advém da imprevisibilidade.
Logicamente o parto em contexto extra-institucional encerra um risco de mortalidade acrescido, mas sem expressão estatística.

2. Muitos pretendem colar a imagem dos Enfermeiros ao(s) (insucessos do) parto domiciliário, mas atenção: inúmeros médicos estão, também, envolvidos, tal e qual os Enfermeiros! Não só envolvidos no entrecho, mas também nos casos de insucesso (embora não publicitado!). Alude-se sistematicamente aos casos de insucesso, mais esquecem-se dos milhares casos de sucesso.
Portanto, esta posição dos Médicos contra os Enfermeiros carece de coerência, uma vez que os seus próprios colegas estão envolvidos. Parece-me sensato direccionar as críticas para o procedimento e não para uma classe em particular!

3. Os Enfermeiros reivindicam o retorno à naturalidade do parto, sempre que a condição de saúde (mãe/feto) o permita, e criticam a elevada e não fundamentada ingerência médica/tecnológica num fenómeno que é por si... natural. Mais uma vez: o conceito de naturalidade reporta-se ao fenómeno, não ao local. Os Enfermeiros não defendem partos no mato (muito menos nas ambulâncias!).

4. Os Enfermeiros são os profissionais mais habilitados e experientes para o follow-up de grávidas e partos de baixo risco; todavia, para que melhorem ainda mais a sua performance necessitam que lhes sejam reconhecidas as tais competências previstas pelas referidas directivas. Os estudos são claros: os Enfermeiros detêm sempre melhores taxas de sucesso, comparativamente aos Médicos nos partos de baixo risco (que são aqueles que legalmente os profissionais de Enfermagem podem executar, e portanto passíveis de serem estudados e comparados), de forma invariável relativamente ao contexto: hospitalar ou extra-hospitalar.

5. A taxa de mortalidade infantil diminuiu drasticamente em Portugal (tal como em todos os países evoluídos) por vários motivos que não  "a presença do médico no trabalho de parto" - tal como se deduz ao analisar os dados que a Organização Mundial de Saúde disponibiliza.
O incremento das qualificações de todos os profissionais, a melhor compreensão científica da gravidez e parto, a evolução das técnicas de diagnóstico e acompanhamento, o apuramento e desenvolvimento tecnológico, a melhor qualidade/condições de vida e informação/pedagogia das grávidas e famílias, a genética preventiva, etc, etc.
  
Vários países detêm melhores indicadores que Portugal. Analisando pormenorizadamente os dados, percebemos que em muitos desses países os Enfermeiros seguem a gravidez em toda a sua globalidade e executam o parto sem intervenção médica, sem esquecer que também o fazem no domicílio sob condições controladas. Conclui-se que a grandeza do sucesso não está na figura do Médico, mas sim num conjunto de factores (em cima descritos). Nas situações graves, a colaboração de todos os profissionais é a chave do sucesso!
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Disclaimer: os links que comprovam as várias afirmações, não estão, como repararam inseridos no post. O dia já vai na sua vigésima sexta hora.... a seu tempo, se necessário, apresentá-los-ei. É uma questão de justiça familiar.

Comments:
Cheguei, li e adorei! Cumps
 
Tão bom este Post :) Obrigado DR ENFERMEIRO por aqui e ali ir elevando o nome da Enfermagem e repondo verdades escondidas...

Força para continuar!
 
Não me leve a mal Dr. Enfermeiro, mas creio que este pos´t não é claro, já que mistura a problemática dos partos no domicílio com a “guerra” entre enfermeiros obstetras e médicos obstetras.

Como enfermeiro, fiquei preocupadíssimo em saber que a mesma enfermeira (Ana Ramos) está envolvida em pelo menos 3 casos nítida má prática. Parece que a Ordem, para breve, vai dar o seu veredicto. Ainda bem.

É um facto que a enfermeira Lúcia Leite não teve o tempo necessário para expor o seu ponto de vista, mas relembro que em televisão o tempo voa. Veja-se o discurso do médico: embora eu possa não concordar com o seu ponto de vista, reconheço que teve uma intervenção clara e objectiva.

Quanto à “guerra” de que há pouco falava, penso que é má estratégia. Não vamos a lado nenhum se continuarmos a crispar relações com outros profissionais de saúde. É um facto que os médicos falam como se estivessem em cima de um pedestal, mas eu pergunto: é ou não verdade que em muitos blocos de partos e maternidades, poderia proporcionar-se às grávidas outro tipo de condições (mais humanizadas)? Porque é que os enfermeiros por vezes se acanham tanto?
 
não sei se viram, mas a classe médica parece estar ao ataque a classe de enfermagem!!
vejam só a opinião expressa neste artigo do publico referente a denuncia realizada pelo SEP estes dias.
http://www.publico.pt/Sociedade/dispositivos-medicos-podem-vir-a-ser-reutilizados-no-sns-1538871

"Reagindo a estas denúncias, o bastonário da Ordem dos Médicos (OM), José Manuel Silva, retorquiu que há pacemakers, de preço muito elevado, que podem ser reutilizados sem prejuízo para o doente."

será que tem de ser sempre contra com aquilo que os enfermeiros defendem!?!? Não devíamos estar a remar todos para o mesmo lado!?!?
o interesse e o bem estar da população!?!?

Parece que infelizmente neste pais é cada um por si e o povo que se "desenrrasque"
 
Em todas as profissões é necessário competência, empenho e humildade. Como em todas as profissões há os bons, os menos bons e mesmo os maus e os que trabalham apenas pelo dinheiro.
 
Acho que não há muito mais a acrescentar sem dizer asneiras.
 
Quando falamos de partos de "baixo risco","o sucesso" deve-se aos Enfermeiros: "...os profissionais mais habilitados e experientes para o follow-up de grávidas e partos de baixo risco"!
Quando são partos de "risco", ai já se deve "a colaboração de todos os profissionais".

Depois o "outro" é que profere "declarações corporativistas".
 
Ele há coisas que não me entram. Não sei o que é mais irresponsável, se uns pais quererem ter o parto em casa, se alguém se disponibilizar a fazê-lo.

Vejam este exemplo, pela boca morre o peixe.
http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/internacional/mundo/defensora-de-partos-em-casa-morre-a-ter-segundo-filho
 
Colega Lprolog, não se importa de clarificar melhor o seu ponto de de vista :)

A Ordem dos Enfermeiros já está em acção.
http://www.ordemenfermeiros.pt/comunicacao/Paginas/Partosemcasamotivamcampanhadedesinforma%C3%A7%C3%A3osobrecompet%C3%AAnciasdosenfermeirosespecialistas.aspx
Vejo contudo, algum azedume. Isto ainda vai acabar mal…
 
Caríssimo DE: P A R B É N S pelo EXCELENTE post com um conteúdo fantástico! até parece um EESMO a falar! :-)
Queria acrescentar uma coisa que me parece fundamental frisar bem: A OE, ao contrário do que se diz por aí, não fomenta nem publicita o parto ao domicílio; apenas aceita que casais possam optar por essa forma de parir, desde que seja feito por um profissional qualificado para o efeito sendo que, ao contrário do que diz o dr João Silva Carvalho, além dos médicos obstetras os EESMO TAMBÉM SÃO PROFISSIONAIS QUALIFICADOS para acompanhar a grávida, o parto e o puerpério de forma TOTALMENTE AUTÓNOMA e SEM a supervisão médica. Lamento que um representante da OM demonstre tamanha ignorância e altivez relativamente aos meus colegas de especialidade. quanto ao que foi dito relativamente à participação médica no programa BOA Tarde, deixe-me que vos diga que foi... deplorável! Basta pegar num único ponto: a LEGIS PRAXIS, em que refere que os médicos tÊm sempre em conta as vontades/necessidades das grávidas... Bravo à Adelaide Sousa que prontamente negou tudo afirmando sem papas na língua que os médicos são os 1ºs a negarem a possibilidade de um plano de parto apresentado pelo casal grávido seja tomaddo em consideração.... E sim, está provadíssimo, por mais que doa a muita gente, que para partos de baixo risco os profissionais mais qualificados são os EESMO. A minha sugestão era um Prós e Contras relativo, não ao parto em casa, mas sim, relativo ao parto natural vs cesarianas e induções de aprto a vulso (da única responsabilidade médica)... e a possibilidade dos casais verem as suas necessidades mais bem observadas nas insituições de saúde.
 
"Os Enfermeiros são os profissionais mais habilitados e experientes para o follow-up de grávidas e partos de baixo risco" não soa um pouco a um atestado de incompetência? Então os EESMO não são estão preparados para dar resposta a situações mais complexas?
 
"Os Enfermeiros são os profissionais mais habilitados e experientes para o follow-up de grávidas e partos de baixo risco" não soa um pouco a um atestado de incompetência? Então os EESMO não são estão preparados para dar resposta a situações mais complexas?"

Não, daqui vê-se a responsabilidade da Enfermagem, e não asua incapacidade; os enfermeiros não são milagreiros habilidosos faz-tudo, fazem o que sabem e bem fazem, agindo de acordo com o que sabem e podem, e direccionando os utentes para outro tipo de respostas diferenciadas;

acontece o mesmo aqui nos partos de baixo risco; se forem de alto risco, entao a progenitora terá que estyar em ambiente hospitalar, com a presença, lógico, de médicos obstretas, caso haja necessidade de intervenção médica; não consigo extrair o sumo de "guerrinhas" como lhe chamam...
 
Quantas Enfermeiras parteiras optam por ter os seus próprios filhos em casa? Pois é, muito poucas, porque sabem perfeitamente que o parto hospitalar é mais seguro.
 
@ anónimo 8:46 PM:

Clarificando, o que eu queria dizer é que estou de acordo com aquilo que foi dito com o DE.
 
Esta ideia de ser a favor de tudo o que vem dos Enfermeiros é um erro. Neste caso, esta é claramente uma má ideia.

Nos tempos actuais, faz algum sentido fazer o parto no domicílio? Até nos partos mais simples as coisas podem complicar. As enfermeiras e esposas de enfermeiros deste blog, vão fazer o parto em casa?

É de uma falta de bom senso total esta situação.
 
...temos que concordar com uma coisa, o avó pode ser medico, mas como medico, meu caro deveria estar mais envolvido no nascimento do seu neto,aconselhando o seu filho...e nora...olhe sou enfermeiro e o meu filho nasceu com 38 semanas por parto induzido numa clinica uma exigência da minha parte, porque pelo seu colega ele nascia com 42 semanas mas já morto...eu estava atento e ascultava o bebe frequentemente quando as pulsações começaram a descer de 130 para 90, 80, 70, sinal claro de sofrimento fetal...exigi a indução do parto recusada por um seu colega no hospital publico, o parto foi efectuado numa clinica e cosntatou-se que o bebe tinha 3 circulares da placenta á volta do pescoço, mas um dia morria...não são só enfermeiros que falham os senhores falham mais como medicos e como pais e avós que deveriam, estar mais atentos...os meus pesames
 
Erro estratégico! Perderão os EESMO.
 
Porque infelizmente o nosso Bastonário (que é um EESMO) se esqueceu que UM PARTO NÃO É SÓ UMA GRÁVIDA aqui deixo a posição do colégio de pediatria dos médicos:

"«A Direcção do Colégio de Pediatria, tomou conhecimento com a maior perplexidade e estupefacção da mensagem do Senhor Bastonário da Ordem dos Enfermeiros defendendo os partos em casa assistidos por enfermeiros.
Sem prejuízo de uma posição mais fundamentada a tomar em conjunto com os Colégos de Ginecologia e Obstetrícia e de Neonatologia e com as Sociedades Científicas relacionadas com esta área, queremos, no entanto, desde já, manifestar uma primeira reacção perante um tema que merece uma resposta enérgica e incisiva
Não queremos questionar a grande qualidade profissional dos enfermeiros portugueses, que testemunhamos diariamente e da qual também nós nos orgulhamos pois está ao nível dos melhores padrões europeus. Também não duvidamos da elevada competência dos enfermeiros especialistas em Enfermagem de Saúde Materna e Obstétrica e da sua capacidade em prestar assistência a partos normais sob supervisão médica, como sucede diariamente nos nossos hospitais. Precisamente porque conhecemos a capacidade profissional e o sentido de responsabilidade dos nossos enfermeiros, estranhamos esta posição tão despropositada do seu Bastonário. Sabem com certeza os senhores enfermeiros especialistas em Saúde Materna e Obstétrica que, no decurso de um parto inicialmente normal, podem ocorrer situações imprevistas, por exemplo entre outras, um prolapso do cordão ou um descolamento de placenta, que fora de ambiente hospitalar não podem ser resolvidas. Talvez por esse motivo, os enfermeiros que se aventuram a assumir a assistência aos partos no domicílio, para sua defesa, exijam aos pais que assinem um termo de responsabilidade, para o caso de surgirem complicações.
Deixamos que os colegas do Colégio de Especialidade de Ginecologia e Obstetrícia, comentem, caso o desejem, a qualificação destes enfermeiros especialistas como “os profissionais de saúde melhores qualificados em Portugal para assistir ao parto normal e não trabalham sob supervisão médica” como pomposamente proclama o seu Bastonário.
Pela nossa parte, como pediatras, podemos garantir que por muito competentes que sejam, e não duvidamos que muitos o serão, não têm capacidade técnica para uma avaliação clínica autónoma do recém-nascido. Mesmo o melhor pediatra neonatologista no Mundo, poderá não ter condições, num parto no domicílio para resolver algumas situações imprevistas, que seriam facilmente solucionáveis atempadamente em meio hospitalar.
Temos hoje em Portugal uma das taxas de mortalidade neo-natal mais baixas do mundo, o que se deve em grande parte ao enorme esforço de acabar com a realização de partos nos domicílios e nos hospitais sem condições e à criação de unidades de neonatologia nos hospitais de referência.
Para que o parto em casa pudesse ser uma opção admissível, em certos casos, seriam necessários meios logísticos muito sofisticados e dispendiosos, para nós incomportáveis, para apoio assistencial ao domicílio e transporte medicalizado atempado dos recém-nascidos e grávidas com problemas inesperados. Saliente-se que nos poucos países onde existe essa prática, a mortalidade perinatal é superior à nossa.
Na nossa opinião, esta campanha em favor dos partos no domicílio, para além de um retrocesso, representa um enorme risco nas condições actuais do nosso país não só para as grávidas, como certamente reconhecerá o Colégio de Ginecologia e Obstetrícia, como para os recém-nascidos, cuja saúde, bem estar e direitos nunca nos cansaremos de defender.
Solicitamos aos órgãos dirigentes da Ordem dos Médicos que tomem nesta matéria uma posição firme e esclarecida em favor destes jovens cidadãos indefesos e em favor do bom senso.
José Manuel Lopes dos Santos
Presidente do Colégio de Especialidade de Pediatria"
 
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